O gato Félix toma o seu lugar na cama que lhe prepararam em cima da mesa. É daí que, entre sonecas, vai observando o labor dos utentes, que, naquela tarde, integram a oficina do “Manos Sanas”, o mais recente projeto da Misericórdia do Louriçal, através do qual os utentes da estrutura residencial e do centro de dia estão a construir materiais para trabalharem na sala de fisioterapia e para equipar um espaço de snoezelen.

Estrela Cantante, a “artista da casa”, como lhe chama a animadora social Rita Leitão, pinta com destreza e pormenor uma caixa de ovos, que vai ser furada para enfiar paus de gelado e, dessa forma, trabalhar a motricidade fina. Em frente, Margarida Guida está também a fazer trabalho de pintura, mas com molas de roupa, que serão utilizadas para treino cognitivo, enquanto Silvina Dias ficou incumbida de cortar palhinhas, que servirão para encaixar num 'aparelho' criado com paus de espetada, igual àquele que o senhor Rui Lucas vai trabalhando na sala de fisioterapia, localizada no piso inferior.

Rui foi o primeiro a estrear o material. “É a nossa cobaia”, brinca Rita Leitão, enquanto observa o movimento de mãos do utente. “Se for com a direita, vai bem”, diz o idoso, que passa depois a outro exercício, com a ajuda das fisioterapeutas Eva Marques e de Solgey Gutierrez, esta última de origem colombiana e que serviu de inspiração para o nome do projeto.

Agora, a tarefa de Rui Lucas é fazer passar, de forma sequencial, um fio de tecido por dentro de 'túneis' criados com rolos de papel higiénico. O aparelho das palhinhas está agora ao serviço de Maria Carraco, que sofre de artrite, mas que, mesmo com algum esforço, vai conseguindo fazer o exercício. “Com estas mãos, não é fácil, mas temos de teimar”, diz a utente, enquanto encaixa mais um pedaço de palhinha.

Rita Leitão explica que o “Manos Sanas” é um projeto multidisciplinar, que trabalha aspetos como a motricidade fina e “a capacidade para a execução de movimentos precisos com as mãos e dedos”, mas também a componente cognitiva. “Podíamos fazer os exercícios com outros materiais, mas para eles é mais motivador utilizarem as ferramentas criados pelos próprios”, sublinha a técnica.

Também a psicóloga Sara Vieira destaca o envolvimento dos utentes em “todo o processo”, desde a escolha das cores até à execução dos materiais. “A tendência é dizerem: 'você é que sabe a cor'. Mas, ao passarmos a decisão para eles, estamos a desenvolver o seu sentido crítico”, alega a técnica, sublinhando que na parte da oficina se trabalham ainda “as componentes estética e lúdica e a terapia pela arte”.

Além de criarem as ferramentas para utilizar nos treinos de motricidade, os utentes estão também a conceber materiais para equipar a futura sala de snoezelen, que trabalhará a estimulação sensorial. A primeira criação foram garrafas sensoriais, para “a estimulação visual e promoção de bem-estar e tranquilidade”, feitas com purpurina, missangas, massas alimentares, lantejoulas e outros materiais escolhidos pelos 'artesãos'. “Será uma sala o mais low cost possível e feita com a participação dos utentes”, realça Rita Leitão, referindo que este é um projeto “da lavra” da psicóloga Sara Vieira, que está também a dinamizar momentos zen, com sessões de ioga e de meditação.

Todas estas iniciativas integram o ‘Tratos Ativos’, programa de envelhecimento ativo da Santa Casa da Misericórdia do Louriçal, desenvolvido para o presente ano e que contempla também o projeto ‘Turistas de trazer por Casa’, que pretende levar os utentes a viajar pelo mundo sem saírem do lar. Rita Leitão explica como: “Semanalmente, exploramos museus, através de visitas virtuais disponíveis online, e passamos por monumentos, através de sites de visualização 3D.” Estão ainda previstas sessões dedicadas às artes, como a música, pintura e modelagem.

Voz das Misericórdias, Maria Anabela Silva