A doença acabou por levar a melhor e Luísa faleceu em janeiro de 2019, mas a ideia não só não morreu como foi materializada num projeto que já ajudou cerca de uma centena de pessoas a enfrentar processos de luto, trauma e patologias do foro oncológico.
Aida Ferreira, 57 anos, é uma das beneficiárias do L.U.I.S.A – Unidade de Intervenção e Apoio ao Luto da Misericórdia da Redinha. Num vídeo gravado para a rubrica “A Vida dos Outros”, da União das Misericórdias Portuguesas, é explicado que chegou ao projeto através de um folheto que alguém deixou na caixa de correio e que a fez perceber que talvez precisasse mesmo de ajuda para lidar com morte do filho.
“Era uma pessoa que gostava de me arranjar. Perdi a vontade de fazer fosse o que fosse. Com o projeto, consegui melhorar isso”, conta Aida, com quem a equipa do L.U.I.S.A tem trabalhado a autoestima, para que consiga cuidar de si “sem sentir culpa de não estar sempre a pensar no filho”.
Psicóloga e coordenadora do projeto, Lia Almeida, explica que a unidade conta com duas equipas. Uma multidisciplinar e de intervenção, que trabalha diretamente com os beneficiários, num acompanhamento de “proximidade” e “diferenciado”, composta por psicóloga, assistente social, dois enfermeiros e nutricionista, contando ainda com o apoio de um advogado que, em regime de voluntariado, presta aconselhamento jurídico.
Há depois uma segunda equipa, “de proximidade”, da qual fazem parte os técnicos das comissões sociais de freguesia e que, pela ligação que têm à comunidade, são “uma ajuda preciosa” na sinalização dos casos.
Andreia Dias, coordenadora de projetos da Misericórdia da Redinha, sublinha que o L.U.I.S.A tem uma abrangência concelhia, tendo, por isso, o atendimento centralizado na cidade de Pombal, em instalações cedidas por uma cooperativa local. “Com um público-alvo tão específico, fazia todo o sentido dar-lhe uma abrangência maior, que ultrapassasse as fronteiras da Redinha e que pudesse chegar ao maior número de pessoas”, alega a técnica.
Iniciado em plena pandemia – junho de 2020 – o L.U.I.S.A já atingiu uma centena de beneficiários, na sua maioria mulheres – cerca de 70 –, quase todos com acompanhamento psicológico, associado ao luto e a doenças oncológicas, mas também ao trauma, neste caso, envolvendo sobretudo antigos combatentes da guerra colonial e vítimas de violência doméstica.
E, se já antes da Covid-19, o apoio ao luto era “uma necessidade” identificada no concelho, com a pandemia tornou-se “ainda mais premente”, afirma Lia Almeida, relevando que, entre os utentes do projeto, estão várias pessoas que sentem dificuldade em lidar com a perda dos seus entes queridos motivada pelas restrições impostas, por exemplo, ao nível das cerimónias fúnebres. E dá o exemplo de uma pessoa que não pôde estar no funeral, por se encontrar infetada, e que “não acredita na morte do familiar, porque não viu, e que até já falou na possibilidade de exumar o corpo”.
A pandemia obrigou também a ajustes no projeto, com a transposição para o online das sessões de sensibilização da comunidade para as temáticas abrangidas pelo L.U.I.S.A e a suspensão dos grupos de entreajuda, que deverão ser iniciados “ainda este ano”.
Adaptações que em nada beliscaram a importância do projeto, assegura Andreia Dias, que não têm dúvidas de que os resultados alcançados até ao momento vieram demonstrar “claramente” que era uma reposta “necessária” no concelho. “Não deixa de ser assustador perceber que existem tantas pessoas a passar por situações de sofrimento e, muitas vezes, a sofrer sozinhas e sem nenhum tipo de ajuda”, constata a técnica.
Segundo Andreia Dias, o objetivo do projeto para o próximo ano é, além de manter o acompanhamento aos beneficiários, dinamizar ações que possam ajudar à sua sustentabilidade, para que possa continuar mesmo depois de terminado do financiamento do Portugal Inovação Social, em maio de 2023.
Voz das Misericórdias. Maria Anabela Silva