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- Valongo | Música para alegrar os dias de ‘tantos idosos sozinhos’
“Tenho tantas saudades, nem imagina quantas”. Madalena Pimenta, 82 anos, utente do centro de dia da Misericórdia de Valongo, está em casa desde março. Sem previsão de reabertura, mais de duas dezenas de pessoas estão como Madalena. A Misericórdia assegura, a quem o solicita, alimentação e higiene, mas pelo caminho perderam-se os estímulos, o convívio e todo um conjunto de atividades que desenvolviam no centro de dia.
Apesar da saudade, o rosto ilumina-se porque hoje Madalena recebe a visita de Nuno Queirós, animador sociocultural da Santa Casa. Nuno não vem sozinho, traz consigo uma coluna de som e a música pronta a tocar. “O velhinho caminhava”, cantada por Marante, traz mais gente às varandas. Madalena Pimenta canta com emoção, indiferente ao olhar dos vizinhos. Esta é mais uma edição da “Música à Varanda”. O projeto nasceu pelas mãos do animador, que não consegue ficar indiferente ao isolamento dos idosos. “Senti que estava a falhar como ser humano”, afirmou.
Durante largas semanas e em plena fase de confinamento, Nuno viu-se impossibilitado de visitar os utentes da Santa Casa. “Mantivemos sempre regras muito rigorosas na instituição para minimizar, ao máximo, o risco de sermos infetados. Durante muitas semanas, o nosso ritual era praticamente casa-trabalho e apenas saídas essenciais”, relata.
O contacto telefónico era a única ligação com os utentes do centro de dia. “Não chegava. Sentia-os tristes, desanimados”, conta. Criativo por natureza, o animador sociocultural, colaborador da Misericórdia há sete anos, juntou dois ingredientes: música e companhia. Com as devidas distâncias e o cumprimento de todas as regras de segurança, em julho deu o pontapé de saída no projeto “Música à Varanda”.
Com a coluna de som ao ombro e aproveitando a pausa para almoço, visita os seus utentes: na varanda, no pátio ou no terraço. Eles escolhem a música, Nuno só toca no play. São cerca de 20 minutos para alegrar e atenuar algumas saudades. “Nunca mais chega a hora de voltar. Muitos beijinhos para todos do lar, que eu não tenho queixa de ninguém”. Madalena Pimenta despede-se assim. Hoje, ao final da tarde, quando falar ao telefone com os filhos, tem algo novo para contar: veio à varanda e ouviu uma das suas músicas preferidas.
Nuno Queirós desenhou o projeto como uma forma de combater o isolamento. À data da visita do VM já tem completa a primeira ronda pelos 22 utentes do centro de dia da Santa Casa. A próxima fase já está em marcha e passa pela estimulação cognitiva. Após longos meses sem qualquer estímulo, é fundamental atuar nesta área. “Com a ajuda dos utentes do lar, estamos a desenhar em lençóis, números, letras e palavras para algumas atividades de estimulação cognitiva. Depois, é só trazer em cada visita e trabalhar um bocadinho com cada um dos utentes”, explica.
Mais do que o reconhecimento pelo trabalho que desenvolve, o animador gostava de ver o projeto abraçado por outras instituições e pela própria comunidade. “O importante era replicar a ideia. Há tantos idosos sozinhos”.
Sobre esta iniciativa, o provedor da Misericórdia de Valongo não poupa elogios ao colaborador. “O trabalho desenvolvido pelo Nuno é altamente meritório. Seja nos seus projetos pessoais, como é este caso, seja em funções na Misericórdia. É um profissional excecional. O seu comportamento e profissionalismo diário, as atividades que desenvolve, têm contribuído muito para amenizar toda esta situação”, disse Albino Poças.
Os elogios vieram, mesmo ao fecho desta edição, em formato de prémio. O projeto voluntário “Nuno e os Idosos” foi galardoado no âmbito do concurso International Ageing Award, instituído pela Associação Nacional de Gerontologia Social. Nuno Queirós arrecadou o grande prémio na categoria Personalidade - Profissional do Ano.
Voz das Misericórdias, Vera Campos