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- Bragança | Projeto para combater solidão e envelhecer com qualidade
Por isso, a cada duas semanas, Manuel vai até ao Centro de Convívio de Portela, onde se encontra com outros idosos e tem fisioterapia e acompanhamento psicológico. Os exercícios são ajustados às suas necessidades e para melhorar a mobilidade dos braços. Foi camionista e ajudou a criar sete netos e quatro bisnetos. A conversa com o VM, que seria sobre ginástica, rapidamente passou a uma troca de vivências e experiências. Porque mais do que melhorar a mobilidade daqueles que já têm alguma idade, o combate da solidão é o que leva os idosos a participar. “Gosto de estar aqui. Aqui passa o tempo sem se dar conta”, salientou.
Albertina da Conceição partilha a mesma opinião. Tem 85 anos e contou que aceitou participar no projeto porque gosta de “conviver com as pessoas”. “Passa-se um bocadinho do tempo e contente, melhor do que estar sozinha em casa”, vincou, acrescentado que passa “anos” sem ver algumas pessoas porque se “metem em casa” e nas aldeias já “não se vê ninguém”, muito menos “jovens”. “É mau estar nas aldeias isoladas”, lamentou.
E enquanto trocava dois dedos de conversa com o VM, foi fazendo exercícios de motricidade fina, nomeadamente um jogo com peças muito pequenas, para ajudar a resolver a pouca agilidade que já tem nas mãos.
Neste momento de implementação do projeto, já há quem se queixe que estas atividades deveriam acontecer mais vezes. De quinze em quinze dias é “pouco”, segundo Maria Afonso. A idosa de 69 anos admitiu que passa os dias “sozinha”, porque o marido sai para trabalhar e o filho já não mora com ela. Visto que tinha de ir abrir o centro de convívio para as sessões, decidiu também participar. “É bom para nós, porque nos diverte, puxamos pela nossa memória, que precisamos bastante, convivemos e só isso é muito bom”, disse enquanto fazia um puzzle.
“Há vantagens nestas ações de grupo, nomeadamente na interação e na quebra do isolamento social”, frisou a coordenadora do projeto, Sandra Bento. Além das sessões conjuntas, na aldeia de Portela, mas também em São Pedro de Sarracenos e ainda nas instalações da própria Misericórdia, o ‘Domus Vitae’ também promove “saúde física e mental de pessoas idosas no domicílio, com ações de fisioterapia e acompanhamento psicológico”.
Ana Maria Miranda é fisioterapeuta na Misericórdia de Bragança há 24 anos e acompanha os idosos que participam no projeto. Admite que é “muito enriquecedor”, porque vai “porta a porta” levar o seu trabalho, que é adaptado “a cada caso”, com exercícios “simples e eficazes”, como apertar os botões de uma camisa, que ajudam nas tarefas no dia a dia, mas também no “fortalecimento muscular, coordenação e equilíbrio”, prevenindo o “risco de quedas”.
Além do trabalho que é feito para desenvolver a capacidade motora, também é feita estimulação cognitiva. “Tentamos fazer com que eles desenvolvam capacidades que sabemos existirem, mas que não estão trabalhadas. A estimulação da memória é extremamente importante”, adiantou a psicóloga Marta Lima.
A par dessas ações, o ‘Domus Vitae’ também desempenha o papel de “ouvir”, trazendo “apoio” e “conforto” a estas pessoas mais isoladas. “Acabam por desabafar. Têm uma vontade enorme de contar o que passaram, o que viveram, muitas vezes tentamos estimular a questão cognitiva através dos acontecimentos mais recentes, porque temos pessoas com patologias e, através de acontecimentos mais recentes, vamos buscar quais as necessidades deles à data atual”, explicou a psicóloga, destacando que, por quererem minimizar a solidão e o isolamento, os idosos participam com facilidade neste tipo de projetos.
Para o provedor da Misericórdia de Bragança, o projeto “resulta da procura constante por parte da instituição em encontrar serviços e respostas inovadoras que contribuam para a melhoria da qualidade de vida dos utentes e enquadra-se na estratégia de modernização do serviço de apoio domiciliário”.
José Duarte Fernandes realçou ainda que a instituição “desempenha um papel crucial no combate ao isolamento social das pessoas no mundo rural, através de diversas iniciativas e serviços”. “Trabalhamos diariamente para a promoção dos pilares do envelhecimento ativo, não só dos nossos seniores, mas também todos aqueles que diretamente ou indiretamente pudermos ajudar”, concluiu.
O projeto ‘Domus Vitae’ envolve 40 idosos, utentes do apoio domiciliário desta instituição e também de outras, como Obra Social Padre Miguel, Fundação Betânia e Centro Social e Paroquial dos Santos Mártires, e ainda pessoas da comunidade. Entre mais de uma centena de candidaturas, a iniciativa foi uma das 15 selecionadas pela Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito do concurso ‘Home Care’. A iniciativa começou em fevereiro deste ano e vai decorrer até novembro.
Ângela Pais, Voz das Misericórdias