Tiago, Sofia, Cláudio, Isabel, Teresa Rita e Mimi tiveram infâncias difíceis, nasceram no seio de famílias disfuncionais que com o tempo se desmembraram e os deixaram à mercê da sua própria sorte. Quis o destino que fossem acolhidos na Casa de Acolhimento (CA) da Misericórdia de Cascais onde viveram e cresceram, numa casa a que chamaram de sua e onde voltam sempre que querem. Hoje são os nomes por detrás das histórias que nos conta o livro ‘Sobre(viventes) – Sete histórias de amor e superação’, da autora Susana Gaião Mota, que foi apresentado ao público no passado dia 17 de junho no auditório do Parque Marechal Carmona, em Cascais.
‘Sobre(viventes) – Sete histórias de amor e superação’ surgiu da vontade e persistência da provedora da Misericórdia de Cascais, Isabel Miguens, dar a conhecer algumas das histórias de vida e vivências de crianças cuja história se cruzou com a da Casa de Acolhimento da Misericórdia. São sete histórias de vida relatadas na primeira pessoa por jovens adultos, acolhidos na CA ainda em criança, entre 1980 e 2018. Todos sofreram, lutaram, superam dificuldades e venceram.
Durante a apresentação do livro, foi dito várias vezes que estes adultos se transformaram em tudo o que nunca tiveram ao seu redor: adultos conscientes, respeitadores, cumpridores e tremendamente humanos.
Qualidades que lhes estavam intrínsecas e que nem a amargura da vida fez desaparecer, mas que também foram alicerçadas pela equipa de profissionais da Casa de Acolhimento, que lhes deu abrigo, alimentação, proteção e apoio para ultrapassar medos.
Para a provedora, este livro regista algum do trabalho que é feito diariamente na Casa de Acolhimento e nele encontram-se histórias que a “tocaram profundamente, de pessoas que não tiveram as nossas hipóteses, mas que conseguiram singrar tal qual as tivessem. São testemunhos verídicos de jovens adultos que conseguiram superar” um período menos bom das suas vidas e que nos “vai ajudar a relativizar” muita coisa do nosso dia-a-dia, disse Isabel Miguens durante a apresentação do livro.
Susana Gaião Mota, jornalista e psicoterapeuta, especializada em trauma e terapia de casal, foi a autora desafiada pela provedora a escrever este livro, um convite que disse ter aceitado prontamente. Mas o grande desafio, revela, estava para vir com as histórias que ouviu. “Foi difícil – escrever o livro – porque não são situações nada fáceis, e custou a escrever algumas coisas”.
Nas notas da autora, que fazem parte da obra, Susana Gaião confessa que muitas vezes “protelava com um desconforto enorme” o momento de escrever sobre as histórias que tinha ouvido.
Para a autora, “mais do que as boas histórias ou as pessoas complexas que encontrei, o melhor foram as lições de vida e de humanidade que estes jovens adultos me deram. São pessoas com grandes corações e uma capacidade de perdão incomum.”
Exemplo disso é Rita, hoje com 28 anos, a viver nos arredores de Lisboa e para quem a Casa de Acolhimento, onde foi acolhida com cerca de dois anos e lá viveu toda a sua infância e adolescência, sempre foi a sua casa. No seu testemunho diz que não sente “mágoa” pela sua história e afirma mesmo que “ir para a CA foi o melhor que me aconteceu, eu digo sempre que fui muito mais feliz aqui do que se tivesse vivido com um pai e com uma mãe. Hoje consigo perceber que tudo o que aconteceu, o melhor e o pior, faziam parte e que, se calhar, numa casa não teria tanto apoio”.
Uma visão do que pode ser uma CA que a provedora também quer passar porque, nas palavras da própria, “este livro é o testemunho positivo de coisas que são possíveis porque se eles conseguiram outros vão conseguir” superar as dificuldades da vida.
A sessão de apresentação deste livro, que pode ser adquirido em livrarias de todo o país, contou ainda com a participação do presidente da Câmara Municipal de Cascais, Carlos Carreiras, e de Catarina Marcelino, vice-presidente do Instituto de Segurança Social. Também alguns dos jovens que prestaram o seu testemunho para o livro e funcionários e ex-funcionários da CA marcaram presença na sessão.
Voz das Misericórdias, Sara Pires Alves