Segundo a provedora, cumprir a obra de misericórdia que manda dar apoio aos peregrinos “dá-nos imensa alegria”

À medida que o 13 de maio se avizinha, as estradas que convergem para o santuário mariano de Fátima assemelham-se cada vez mais a formigueiros humanos arrastados por uma vontade, um destino, ou uma promessa que se cumpre. Ao longo de todas elas, é constante o fluxo de pequenos grupos familiares, de vizinhos ou de companheiros que a jornada pedestre aproximou e tornou solidários. Nesta caminhada de fé, ao longo de vários quilómetros, muitos dos grupos encontram conforto e cuidados em instalações das Santas Casas, que abrem as suas portas para lhes dar apoio.

Um desses casos é o da Misericórdia de Coruche, que já há largos anos acolhe peregrinos oriundos do sul do país, com a cedência de um local de pernoita, serviço de refeições e cuidados de saúde.

“São nestes pequenos gestos que vive a verdadeira essência e espírito das Misericórdias, cumprindo uma das suas obras”, conta ao VM Maria Ribeiro da Cunha, provedora da instituição.

“O apoio ao peregrino é uma das obras de misericórdia e nós, já há vários anos, que temos esta cultura de ajuda. No início, o acolhimento era feito no lar, depois no antigo hospital, mas, como de ano para ano foram aumentando os grupos, optámos por recebê-los na praça de touros, que é um espaço onde conseguimos, efetivamente, acolher mais grupos, com melhores condições”, explicita.

Na praça existe uma enfermaria onde um grupo de profissionais de saúde trata das bolhas e de outras pequenas mazelas, comuns entre quem caminha a pé.

Nos meses com mais peregrinos “isto mais parece um hospital de campanha”, conta a provedora, sublinhando que tudo é feito de forma voluntária. “Isto dá-nos imensa alegria porque estamos a fazer uma obra de caridade”.

Este acolhimento e apoio aos peregrinos tem a particularidade de envolver os mesários da instituição: são eles que ajudam na confeção das refeições e ajudam a servir o jantar e o pequeno almoço, servido logo pelas seis horas.

Guilhermina Serrão, mesária da Misericórdia de Coruche, integra esta equipa de voluntários de cerca de dez pessoas. “Ao longo destes anos, já os consideramos como uma família. No curto espaço de tempo em que convivemos, partilhamos experiências, interesses, desejos e vivemos o sentimento de sermos cristãos, de dar a mão ao próximo”.

Além das refeições, os peregrinos também podem tomar banho no Pavilhão Gimnodesportivo, cedido pela autarquia, conforme refere Luís Nobre, também mesário. Segundo explica, os grupos em peregrinação fazem um contacto prévio com a Santa Casa que, depois, prepara toda a logística necessária ao acolhimento.

“Todos se sentem bem aqui. Há muito passa-a-palavra e, por isso, uma grande procura. Vive-se aqui um clima de alegria genuína. Costumamos brincar muito com eles, pelo facto de estarem numa praça de toiros. Dizemos: ficam divididos por sectores e isso facilita-nos o trabalho”, diz, com um sorriso, a provedora.

"É muito importante que as Santas Casas que estejam na rota dos peregrinos apoiem. Primeiro, porque divulgamos a nossa ação. Depois, porque é importante fomentar este espírito de voluntariado e de serviço em prol do outro", conclui.

Helena Vieira, mesária e voluntária neste apoio, conhece de perto a realidade das peregrinações a Fátima. “Comecei por devoção à Nossa Senhora. Experimentei um ano para ver se conseguia e consegui. Isso deu-me força para me fazer ao caminho em anos seguintes. Nunca fui com promessa, fui sempre com espírito de sacrifício. Todos os anos lá vou porque tenho sempre coisas para agradecer”.

Este ano, foram cerca de 350 peregrinos que utilizaram as instalações da Santa Casa de Coruche, divididos entre os dias 8 e 10 de maio. Um desses grupos, oriundo de Viana do Alentejo, já faz esta caminhada há três anos.

Ana Paula Pão Mole, guia do grupo, conta que as peregrinações a Fátima começaram em 2017, “em honra das obras do Santuário de Nossa Senhora de Aires”, como forma de agradecimento.

A peregrinação a Fátima é, pois, para Ana Paula “uma festa, um sentimento religioso e um sentimento de ajuda”. Durante a peregrinação há pessoas neste grupo que “querem ir recolhidos no seu pensamento, há outros que querem ir na conversa em conjunto… cada pessoa tem um sentimento muito íntimo”. Porém, existe sempre um espírito de partilha de fé.

Para esta peregrina, a chegada ao santuário é de “uma meta alcançada, com algumas lágrimas à mistura”.

O mesmo sentimento é partilhado por João Reis Mendes, que integra um grupo de Alcácer do Sal. Esta é já a 17ª peregrinação deste grupo que percorre 200 quilómetros anualmente para “uma caminhada que permite sair do dia-a-dia, pensar a fundo na vida: no que foi feito, e no que pode ser feito para melhorar”.

“Quando vimos de Fátima, trazemos o coração cheio para podermos, depois, por em prática uma vivência diferente”, diz João Reis Mendes.

A peregrinação internacional de 2019, que decorreu 102 anos após os acontecimentos da Cova da Iria e dois anos após a visita do Papa Francisco, teve como tema "Dar graças por peregrinar em Igreja". Voz das Misericórdias, Filipe Mendes