O último ano desafiou limites individuais e coletivos, exigindo leituras atentas da realidade e reajustes permanentes da intervenção. Na transição para 2021, a vacina trouxe esperança, mas a regra continua a ser proteger, cuidar e resistir. Para assinalar a data, recolhemos os testemunhos de 13 “heróis anónimos” que garantiram cuidados a quem mais precisava. Não hesitam em dizer que “voltariam a fazer tudo de novo” e atribuem o mérito à equipa que servem de forma comprometida. Relatos de quem cuida por vocação.

‘Voltaria a fazer tudo de novo’

Em março de 2020, Isabel Santos votou-se a uma clausura voluntária no lar da Misericórdia de Ovar para proteger os idosos, num momento crítico da pandemia. Recorda então a falta de conhecimento, materiais de proteção e testes, que tanta incerteza e medo disseminou.

Nesses dias, em que Ovar esteve limitada por uma cerca sanitária, Isabel e as colegas deixaram tudo para trás sem pensar duas vezes. “Sabíamos que tínhamos de fazer o nosso melhor”. E isso significava cuidar sem limites e esbanjar afetos nos intervalos das refeições e higienes. “Procurava que não lhes faltasse carinho e atenção”.

Reconhece que é impossível esquecer os quinze dias aqui passados em permanência. Mesmo aqueles onde a tristeza foi inevitável devido ao agravamento do estado de saúde dos idosos. “Eles são um pedacinho de nós, custa vê-los sofrer”.

Atordoadas pelo cansaço, Isabel e as colegas uniram-se em torno de uma missão que não mais as deslaçou. “Sinto que ficámos mais próximas, bastava um olhar para saber o que a outra estava a sentir”. Foi uma lição de fraternidade que mudou a sua vida e hoje é uma pessoa mais paciente, tolerante e resiliente.

Um ano depois, não hesitaria em regressar. “Não seria capaz de estar em casa sabendo que precisavam de mim. Voltaria a fazer tudo de novo”.

Isabel Santos, 45 anos, trabalhadora de serviços gerais, Misericórdia de Ovar

Voz das Misericórdias, Ana Cargaleiro de Freitas