O último ano desafiou limites individuais e coletivos, exigindo leituras atentas da realidade e reajustes permanentes da intervenção. Na transição para 2021, a vacina trouxe esperança, mas a regra continua a ser proteger, cuidar e resistir. Para assinalar a data, recolhemos os testemunhos de 13 “heróis anónimos” que garantiram cuidados a quem mais precisava. Não hesitam em dizer que “voltariam a fazer tudo de novo” e atribuem o mérito à equipa que servem de forma comprometida. Relatos de quem cuida por vocação.

‘É tão pouco o que lhes resta’

“O dia seguinte é sempre tristíssimo para quem fica porque não se ouvem as crianças e os idosos, apenas um silêncio sepulcral”. Este foi o cenário em março de 2020 e voltou a repetir-se em janeiro de 2021, com o encerramento da creche, jardim de infância e centro de dia.

O regresso a casa foi encarado com desalento pela maioria dos idosos “que já sabiam o que os esperava”. Por mais que a equipa se reinvente, no apoio prestado ao domicílio, nada substitui a dinâmica que se vive no Centro Social da Trafaria: gargalhadas de crianças, vozes que se atropelam e atividades que mobilizam corpo e mente num envelhecimento saudável.

Em casa, apesar das visitas à janela por voluntários da comunidade, Sofia Valério observa “situações de ansiedade e falta de esperança” de quem foi privado de “estar com quem mais gosta nos últimos anos de vida”.

A tudo isto acrescem fragilidades físicas e cognitivas que condicionam a autonomia no dia-a-dia. “É tão pouco o que lhes resta, as pessoas precisam de estar acompanhadas ao longo do dia e de ter uma ligação à realidade”.

Para muitos, este confinamento forçado é equivalente a uma “prisão domiciliária por tempo indeterminado”.

Não sendo o fim de um ciclo, a reabertura do centro de dia, prevista para 5 de abril, representa pelo menos o início do fim da tormenta. “Vai ser um dia de festa”, antecipa.

Sofia Valério, 45 anos, diretora técnica do Centro Social da Trafaria, Misericórdia de Almada