Com as visitas em suspenso, fruto da pandemia de Covid-19, a unidade de cuidados continuados (UCC) da Misericórdia de Ílhavo tem procurado formas de minimizar a saudade das famílias, dos carinhos e dos afetos. As videochamadas surgiram no imediato, mas a equipa da UCC sentia que precisava de fazer mais. Depois do Natal, em que as famílias puderam ver os seus familiares através de uma plataforma elevatória, o início de janeiro ficou marcado por uma visita muito especial. A ‘Palhaços d'Opital’ esteve em Ílhavo com os Doutores Palhaços.
Durante cerca de duas horas, a equipa dos Doutores Palhaços espalhou alegria e boa disposição pelos 45 utentes em internamento. Leandro Oliveira, enfermeiro coordenador da unidade, conta-nos que, por instantes, os utentes conseguiram abstrair-se da pandemia que assola todo o país e o mundo. “Esta foi a forma encontrada de mimarmos os nossos utentes. Com alegria e boa disposição, tentamos compensar a ausência das famílias”. O enfermeiro sabe que “não é fácil” porque é impossível substituir os familiares, mas “tentamos minimizar o mais possível”.
Humor, música e teatro foram algumas das dinâmicas desenvolvidas e que conseguiram cativar “até os mais reticentes”. “Foi muito giro porque eles aderiram, até os utentes mais reservados foram cativados pelo humor e entraram na brincadeira”, explica Leandro Oliveira. Houve cantoria, com cantigas populares, desgarrada e até futebol à mistura. Num improviso muito bem preparado, os “doutores” tocam cada utente de forma particular. Os gostos de cada um, as preferências e as suas áreas de interesse são estudadas ao pormenor para que a interação seja o mais profícua possível. “Ao contribuirmos para o bem-estar geral, sabemos que teremos reflexos positivos no estado emocional e físico do utente” frisa o coordenador da UCC.
Jorge Rosado é o corpo e a alma do Doutor Risotto. Conceituado ‘Palermologista’, assume-se como um otimista estupidamente feliz. Em declarações ao VM, Risotto mostrou-se muito contente com a visita a Ílhavo. “Foi a primeira unidade que visitamos em 2021 e foi uma experiência encantadora”. Em março de 2020, a ‘Palhaços d'Opital’ viu-se impedida de manter as visitas presenciais aos cinco hospitais parceiros: Unidade Local de Matosinhos, IPO de Coimbra, Centro Hospitalar Baixo-Vouga (Aveiro), Hospital Distrital da Figueira da Foz e no Centro Hospitalar Tondela-Viseu.
“Em vez de ficarmos parados a pensar muito no problema, optamos por encontrar soluções”, explicou Jorge Rosado. Criar um canal de Youtube e desenhar conteúdos para o digital foi o recurso encontrado. “Entre março e dezembro desenvolvemos 79 vídeos”. No digital e nas redes sociais apelaram e ensinaram como usar corretamente a máscara, as regras de higienização e outros cuidados a ter perante esta pandemia. Dinâmica por natureza, a equipa esteve sempre disponível para colaborar com instituições e profissionais de saúde. Enquanto se manteve o confinamento, aproveitaram também para desenvolver novas dinâmicas.
Desengane-se quem pensa que estes palhaços doutores trabalham na base do improviso. “A pessoa é sempre o centro da nossa dinâmica. Tentamos encontrar o que melhor se adapta a cada utente”. Com o objetivo de surtirem um impacto efetivo no bem-estar de quem os acolhe, todas as dinâmicas são estruturadas. “Em média, cada nova dinâmica tem entre três a seis meses de preparação. Fazemos pesquisa, formação musical, muito ensaio” adianta Risotto, que conta com a companhia de uma equipa de dez elementos mais um. Doutores Palhaços são mais três: Doutora Donizete Chiclete, Doutora Bem Haja e Doutora Milla Nezza.
Em julho, mais precisamente no dia três, a equipa regressou ao IPO de Coimbra e às visitas presenciais apenas nesta unidade. Sujeitos a uma higienização rigorosa e a medidas exigentes, os Doutores voltaram a espalhar alegria. Se o cuidar, alimentar, tratar, medicar faz parte da missão das instituições, para esta equipa de doutores, composta por artistas profissionais, com experiência performativa e com formação específica na área do palhaço em ambiente hospitalar, o objetivo é ser alegria em movimento.
A visita da Associação Palhaços d'Opital à UCC de Ílhavo contou com a colaboração da comunidade, que patrocinou a iniciativa, um dado que o enfermeiro Leandro Oliveira também releva. “É importante que a comunidade se aproxime da unidade e perceba o trabalho que aqui desenvolvemos. Que percebam a razão de existirmos. Ainda há quem desconheça o que se faz numa unidade de cuidados continuados”.
Voz das Misericórdias, Vera Campos