Graciete Vaz trabalhou uma vida inteira entre linhas e botões, abrindo casas, talhando tecidos e acertando bainhas. Foi modista durante quase meio século em Lisboa, na zona do Alto de São João, mas há três anos que se mudou com o marido para a pequena aldeia de Vargens, no concelho de Mértola. Mas mesmo na pacatez deste “monte”, onde não moram mais que 25 pessoas, Graciete Vaz continua a ser uma mulher ativa. Criou um grupo de cantares alentejanos (chamado “As Cancioneiras do Vascão” e do qual é autora de algumas das letras), e foi também das suas mãos que saíram parte dos kits “Linhas Solidárias”, entregues recentemente pela Ludoteca Itinerante da Santa Casa da Misericórdia de Mértola às instituições sociais deste concelho.
“Gosto muito de ajudar e foi muito bom. Vim de Lisboa e meter-me aqui no ‘monte’ era complicado. Portanto, desde que possa, participo nestas coisas, pois gosto de ensinar o que sei e de aprender novas coisas”, conta esta mertolense, de 73 anos.
Graciete Vaz costurou algumas das almofadas (e respetivos adereços de estimulação sensorial e cognitiva), que, entretanto, foram entregues no Centro Social dos Montes Altos. A ela juntaram-se mais 17 pessoas, que colaboraram nesta “missão solidária” da Ludoteca Itinerante de Mértola, confecionando almofadas e animais de estimulação sensorial e cognitiva “a partir de casa”.
A produção foi toda distribuída pelos utentes do Centro Apoio a Idosos de Moreanes, do Centro Social de Montes Altos e da Misericórdia de Mértola, num projeto que teve por objetivo “ocupar e valorizar os saberes das nossas beneficiárias e, ao mesmo tempo, criar trabalhos que possam ajudar outras pessoas”, conta a coordenadora da Ludoteca Itinerante da Misericórdia.
Segundo Emília Colaço, as 18 beneficiárias do projeto “aceitaram prontamente” o desafio lançado pela Ludoteca, recebendo “diversos materiais de costura”, que foram depois transformados nos kits “Linhas Solidárias”.
“Acreditamos que pequenas ações como esta podem fazer diferença na vida de alguém. Não temos dúvidas. Não só para quem recebe, mas também para que dá. Individualmente, não podemos mudar o mundo, mas podemos ajudar a tornar o mundo de outras pessoas um pouco melhor”, frisa.
Na opinião da coordenadora da Ludoteca Itinerante de Mértola, “este pequeno gesto de dar o que sabemos fazer fez essa diferença e pôde proporcionar sorrisos a todos os que precisam”.
Ludoteca ‘no terreno’
A criação do kit “Linhas Solidárias” foi uma das ações dinamizadas este ano pela Ludoteca Itinerante da Misericórdia de Mértola. O projeto, coordenado por Emília Colaço e que conta na sua equipa com as animadoras sociais Natália Cardeira e Lurdes Valente, e com a enfermeira Viviana Ribeiro, continua “no terreno” a percorrer diariamente as aldeias do concelho alentejano, apesar dos condicionalismos impostos pela pandemia da Covid-19.
“Levamos propostas de várias atividades que pretendem contribuir para a redução dos sentimentos de solidão e isolamento social e promover sentimentos positivos como a confiança, a autovalorização, a tranquilidade, a esperança e a solidariedade”, explica Emília Colaço.
“No fundo”, continua esta responsável, “tentamos levar uma mensagem de esperança a todos”. “Apesar de tudo, estamos cá a fazer a sentir à pessoa que está em casa e que, quer pelas redes sociais quer presencialmente, podem contar connosco e com a Ludoteca”, acrescenta.
De acordo com Emília Colaço, entre os meses de janeiro e maio de 2021 a Ludoteca de Mértola apoiou 256 pessoas, através da entrega de kits com atividades lúdicas e ocupacionais, do empréstimo de livros ou da promoção “de momentos de conversa”.
No âmbito do projeto foram igualmente realizados vídeos sobre vários temas, como “Vivências e tradições da aldeia”, “Aqui há histórias”, “Arte em Movimento” ou aulas de educação física, depois divulgados na página no Facebook da instituição, além de terem sido criados kits de estimulação cognitiva, entregues desde setembro e adaptados às competências pessoais de cada um.
“Há pessoas que não sabem ler e há outras que não sabem ler, mas sabem fazer contas, outras gostam de pintar, daí esta diferenciação”, conclui Emília Colaço.
Voz das Misericórdias, Carlos Pinto