A Misericórdia de Pernes promoveu, a 21 de setembro, uma “Caminhada pela Saúde Mental”, no Dia Mundial da Doença de Alzheimer, como forma de “alertar para um problema que é um flagelo”.
“Numa altura em que tanto se fala de saúde mental”, sobretudo com o impacto da pandemia da Covid-19 nos mais idosos, a Misericórdia de Pernes quis dar visibilidade ao trabalho desenvolvido pela instituição nesta área, bem como aos profissionais e aos familiares que cuidam destes doentes.
Participaram na atividade, que seguiu “à risca” as normas da DGS, 120 pessoas, entre várias forças vivas da terra, instituições, familiares, e utentes da Misericórdia de Pernes.
“Decidimos fazer esta caminhada, essencialmente, para que este dia ficasse registado na memória de todos quantos participaram. Foi muito interessante o trajeto em si e acresce que esta atividade se insere numa das estratégias para prevenir a demência”, transmitiu ao VM Alice Rodrigues, diretora técnica coordenadora da instituição.
A Santa Casa de Pernes possui a única unidade de demência do concelho de Santarém, acolhendo 10 utentes, sendo a lista de espera “muito grande”, disse a responsável, que destacou a “grandeza e a qualidade do serviço” que é prestado.
“As pessoas foram muito afetadas pela pandemia. Muitas que estavam lúcidas e orientadas, com o confinamento e o isolamento, alteraram o seu estado físico e mental”, sendo que, se no primeiro se consegue alguma recuperação, no segundo “é difícil voltar ao que era”, afirmou Alice Rodrigues.
Vera Torres, responsável direta pela Unidade de Demências, considera que a Misericórdia de Pernes tem acompanhado a problemática de forma interventiva e prática, despretensiosa, com um trabalho que está à vista de todos, principalmente daqueles de quem cuida e das suas famílias, que o reconhecem.
A demência é um desafio enorme para um número crescente de famílias, uma das principais causas de dependência e incapacidade. Para Marina Martinho, enfermeira da Misericórdia de Pernes, esta caminhada serviu “de alerta” para quem está menos desperto para esta problemática.
“Não devemos esquecer de quem se esquece”, disse, apontando que esta atividade foi importante, também, para estimular os utentes que participaram.
“Os tempos de confinamento foram especialmente duros para os mais idosos que se viram privados de fazer muita coisa. Nesta fase da vida, verem-se com certo tipo de regras e restrições é algo que os leva a pensar porquê?”, refletiu, deixando um alerta: “não podemos ignorar o impacto devastador nas pessoas com demência, nas famílias, nos cuidadores e nos sistemas de saúde e de proteção social”.
A mesma opinião é partilhada por Marta Alves, diretora do curso Técnico Auxiliar de Saúde da Escola Técnica e Profissional do Ribatejo (ETPR), uma das instituições parceiras desta “Caminhada pela Saúde Mental”.
“Foi uma atividade de louvar. Tanto se fala em saúde mental, mas poucas são as ações que a promovem efetivamente. Esta caminhada fez também esse papel de prevenção dessa situação. E faz todo o sentido trazer alunos que estão num curso técnico de auxiliar de saúde para que eles passem a dar importância à demência. Importância no sentido de poder ajudar, colaborar, porque estas pessoas precisam”, afirmou ao VM.
Uma dessas alunas, Maria Beatriz, que neste momento realiza um estágio profissional na Misericórdia de Pernes, não tem dúvidas que a comunidade em geral deveria estar mais desperta para esta problemática.
“As pessoas deviam estar mais informadas porque, cada vez mais se torna um problema atual que precisa de soluções e chamadas de atenção pública”, declarou.
De fato, de ano para ano, verificamos que as diversas iniciativas, realizadas no mundo, para captar a atenção da comunidade, ganham maior impacto. Contudo, apesar dos progressos, há ainda muito trabalho a fazer no que se refere ao combate ao estigma, à informação e à formação.
É essa a opinião de Luísa Calçada, geriatra da Misericórdia de Pernes. “Fala-se muito da demência, mas não se vê o trabalho feito na área. O cuidado de tratar de uma pessoa idosa que esteja envolvida na comunidade, ou mesmo estando num lar, mas que tenha as suas capacidades é diferente de tratar de uma pessoa com demência. E duas pessoas distintas com demência têm que ter um tratamento diferenciado. Há ainda muito a fazer nesta área”, afirmou.
“Temos que agir hoje, trabalhar, afincada e concertadamente, na prevenção para que possamos dar melhor qualidade de vida às pessoas com demência, famílias e cuidadores”, concluiu.
Foi precisamente esse pressuposto que esteve na base da criação, em 2016, de uma resposta especializada em demências. A obra tem o cunho pessoal do provedor da instituição, Manuel Maia Frazão, que destacou o esforço de uma “equipa comprometida” com “o cuidar com bondade” aqueles que mais precisam.
Mas, mais do que cuidar de quem sofre, para Maia Frazão, importa dar apoio às famílias. “Sabemos que as famílias, mais do que os utentes, sofrem por estar a cuidar deles. É muito desgastante. Cuidar das famílias para o descanso do cuidador é tão importante, em muitos casos, como cuidar do próprio doente”.
Voz das Misericórdias, Filipe Mendes