Rui Maiato nasceu na Murtosa em 1940. No seio de uma família humilde, cresceu com os pais e o irmão numa aldeia pacata, onde a lavoura era, basicamente, a única atividade económica. Um surto de tifo, em 1945, ditou o falecimento de muita juventude, incluindo o seu irmão, então com 13 anos. Menino interessado na escola e com capacidades reconhecidas pela professora primária, foi escolhido para realizar o exame de admissão ao liceu que permitia prosseguir estudos, após a 4ª classe. “Era um exame que se fazia no liceu em Aveiro. Eu fui um dos cinco alunos que a minha professora levou e digo-lhe que achei aquilo relativamente fácil”, conta-nos Rui Maiato. Apesar do acesso garantido ao liceu, pois tinha superado com sucesso o exame, “a pobreza extrema da minha família não permitia ter um filho a estudar”, recorda, acrescentando que “às vezes nem para comer tínhamos”.
Um padre, familiar afastado, seria o “passaporte” para a etapa seguinte. “A minha mãe escreveu-lhe uma carta, a explicar a situação, para ver se ele conseguia pôr-me a estudar”. Fazemos uns parênteses para falar da progenitora: “A minha mãe foi uma autodidata. Só tinha a 1ª classe, mas gostava muito, muito de ler. Ainda que escrevesse com muitos erros, conseguia escrever de forma ordenada, com princípio, meio e fim”.
Após algumas diligências, o eclesiástico permite a Rui Maiato concretizar o sonho de prosseguir os estudos por meio da ordem dos Salesianos, que à época se dedicavam ao ensino profissional no Porto. Em 1951, iniciava o curso de Artes Gráficas/Tipografia, que concluiu com sucesso.
“Anos felizes. Tínhamos campo de futebol e basquetebol. Éramos jovens com sangue na guelra. Gostei muito”. Curso concluído, faltava o emprego que não tardou a surgir. “Tive muita sorte”, reconhece. “O jornal Comércio do Porto estava a admitir dois tipógrafos para ocupar a vaga de dois colaboradores que se iam reformar e eu fui um dos escolhidos”. Tinha 17 anos e um emprego “com um excelente ordenado, acima da média de um operário”.
Desses anos lembra o ambiente excecional que se vivia entre gráficos e jornalistas. Nesta altura, vivia num lar de jovens fundado pela Diocese do Porto em colaboração com a Juventude Operária Católica. Por lá continuou até casar aos 31 anos. A modernização e transformação tecnológica que se registou no mundo, com especial relevo nos meios de comunicação, suscitaram mudanças também no Comércio do Porto.
Rui Maiato andava na casa dos 30 quando foi “reciclado por um engenheiro belga para o novo sistema de produção gráfica”. Adaptou-se com facilidade e o tipógrafo Maiato era, agora, designer gráfico. Incapaz de acompanhar financeiramente sucessivas e consecutivas necessidades de modernização e reestruturação tecnológica, o Comércio do Porto haveria por terminar a sua missão ao fim de 151 anos de atividade e terminava também uma etapa para Rui Maiato, na altura com 50 anos.
Sem baixar os braços, em menos de um mês estava novamente no ativo, agora numa empresa gráfica. Sem a agitação característica de um jornal, o entusiasmo já não era o mesmo, mas em tudo o que fez sempre primou pelo profissionalismo e rigor que tinha aprendido com os seus “mestres”. Os anos passaram, a modernização continuava a passos largos e Rui Maiato decidiu seguir a seu tempo o caminho da reforma.
Em 2008, por razões pessoais, regressa à sua terra natal e encontra no lar da Misericórdia da Murtosa a nova casa, onde se mantém. Também aqui colaborou na elaboração do boletim da instituição, mostrando que “quem sabe não esquece”.
Voz das Misericórdias, Vera Campos