José Abílio Coelho é jornalista, historiador e responsável pelo acervo histórico da Misericórdia de Póvoa de Lanhoso

Quem sobe pela zona de Braga para as montanhas do extremo norte, rumo aos confins da Galiza, há de passar por um castelo no alto de um monte que certamente lhe despertará a atenção, um dos marcos da bela vila da Póvoa de Lanhoso, “terra de brasileiros”. No centro da vila, é às portas do Palacete das Casas Novas, defronte ao bonito jardim conhecido como Largo António Ferreira Lopes, fundador da Misericórdia local, que encontramos o sorriso amigo de quem é uma autêntica sentinela das memórias desta instituição. Trata-se do jornalista e historiador José Abílio Coelho, presentemente responsável pela coordenação do arquivo histórico da Misericórdia da Póvoa de Lanhoso.

De silhueta jovial, só a barba com tons cinzentos confirma o que conta: “sou irmão desta Santa Casa desde 1980”. O local é simbólico para o encontro, já que afirma ser “fascinado pela figura de António Lopes e da sua esposa, Dona Elvira Lopes”. A profissão nas veias fala mais alto e Zé Abílio, como gosta de ser tratado, ressalta os elementos arquitetónicos do belo palacete, atualmente o Lar de São José, da Santa Casa. A cor verde no revestimento de azulejos é uma das características ao gosto dos muitos que emigraram para o Brasil, fizeram fortuna e retornaram, tal como o benemérito da instituição. O edifício também envolve aquele que considera ser o maior desafio da sua vida: “apoiar o provedor Humberto Carneiro na transformação do palacete das Casas Novas num museu, já que foi a antiga residência de António Ferreira Lopes, o “brasileiro” fundador do hospital que, em 1928, resultou na criação da Misericórdia”.

Durante os últimos 30 anos, o historiador foi reunindo milhares de documentos acerca das personalidades de António Lopes e da esposa, espólio que tem usado nas conferências, congressos e seminários em que participa. O convite para reestruturar e tornar-se o responsável pelo acervo da Misericórdia foi um passo natural. Entre as muitas realizações durante este tempo destaca as comemorações do centenário da fundação do Hospital António Lopes, em 2017, altura em que esteve presente na instituição o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

José Abílio Coelho considera que as comemorações do centenário foram importantes porque centraram-se na mostra do acervo que foi preparado, limpo e catalogado e que, após as exposições, foi guardado já com a intenção de ser integrado no futuro museu. “Temos quatro séries fantásticas de peças”, conta-nos. “A primeira é de grande importância para a história das Misericórdias portuguesas, pois, tendo estas irmandades, na criação, modernização e sustentação dos seus hospitais, especialmente ao longo da segunda metade do século XIX e por todo o século XX, a sua principal missão, é importante que o espólio das valências de saúde seja valorizado e mostrado”.

Há ainda um razoável conjunto de arte sacra e um bom lote de documentação, ambos do século passado, para além de um acervo que tem vindo a ser trabalhado e que reúne peças marcantes da vida do fundador, que vão das loiças de altíssima qualidade, pintadas e com o monograma do benemérito em destaque, usadas nos banquetes oferecidos no palacete da Póvoa de Lanhoso, a um conjunto de vasos e jarras importados, candeeiros de diversas procedências ou peças de uso pessoal.

Historiador com mais de vinte livros e duas dezenas de artigos científicos publicados entre a Europa e a América do Sul, vários deles sobre “brasileiros de torna viagem”, as suas vidas e o papel de beneméritos da assistência que desempenharam em Portugal, sobretudo no século XIX e seguintes, José Abílio é investigador do Lab2Pt – Laboratório de Paisagens, Património e Território, da Universidade do Minho. Só entre 2016 e 2017 publicou quatro livros, sendo o mais importante deles o livro de comunicações do seminário “As Misericórdias e a Saúde: Passado, Presente e Futuro”, que coordenou conjuntamente com o provedor Humberto Carneiro, e do qual participaram outras figuras de proa da academia portuguesa, como o então ministro da saúde Adalberto Campos Fernandes ou o atual reitor da Universidade do Porto, António Sousa Pereira.

Despedimo-nos com a promessa de retornar, pois há muita história para contar na Póvoa de Lanhoso e na sua Misericórdia.

 

Literatura para adultos e crianças

A ficção é outra paixão de José Abílio Coelho. Teve a oportunidade de privar e fazer amizade com figuras como Jorge Amado, Fernando Assis Pacheco ou Altino do Tojal. É autor de seis livros de contos e cinco de literatura para crianças, sendo que o mais recente será publicado neste Natal: “Quando o Pai Natal veio às Terras de Lanhoso”, escrito a “quatro mãos” com Maria Rita Coelho, a filha mais nova, de treze anos, que começa a seguir as pegadas literárias do pai.

Apoiar a criação de um museu

Entre tantos projetos, José Abílio Coelho tem entre mãos a missão de apoiar a criação de um museu da Santa Casa da Misericórdia de Póvoa de Lanhoso, por proposta do atual provedor, Humberto Carneiro. O desafio a quem já colaborava há década e meia com a instituição poderia assustar, mas encheu o historiador de motivação, já que era um projeto em que pensava há muitos anos: "Trabalho com o melhor provedor do mundo", disse ao VM.

Voz das Misericórdias, Alexandre Rocha