Ela, Blessing, trabalha na unidade de cuidados continuados (UCC) da Santa Casa Misericórdia do Fundão e começou por estar afeta à higienização dos utentes, na unidade de longa duração, mas a partir do momento que ficou grávida passou para a copa, por ser um trabalho “mais leve, do ponto de vista físico”, explica a diretora técnica da UCC da Misericórdia do Fundão, Cristina Guedes. “Ela é muito responsável, mesmo com a dificuldade da língua ela consegue fazer tudo direitinho.”
A língua tem sido a principal barreira de Blessing. No trabalho, no início, a linguagem gestual e os tradutores online ajudaram. “Não foi fácil nem para ela nem para nós, devido à comunicação. Houve uma interação e ajuda entre as colegas, comunicámos através da linguagem gestual e dos tradutores no telemóvel.”
Hoje, a barreira da língua em nada afeta as tarefas de Blessing que “é simpática, educada, muito cordial com os utentes, e isso é muito importante, e responsável”.
Blessing gosta do trabalho que faz e sente-se bem na UCC da Misericórdia do Fundão. “É bom trabalhar aqui, gosto muito do meu trabalho, as pessoas são simpáticas para mim, apesar de eu não falar bem português.”
Comunicar tem sido o seu principal problema, sobretudo fora do trabalho, como ir ao cabeleireiro e explicar como quer o cabelo, fazer compras, o transporte, pequenas coisas do dia a dia que, dominando a língua, tornaria os seus dias mais felizes. “Tenho dificuldades porque não falo português, às vezes choro por não conseguir comunicar”, admitiu. Uma situação que também dificultou, inicialmente, a nossa entrevista que se seguiu em inglês, língua que Blessing domina bem.
O filho, hoje com três anos, vai aprender a falar português e inglês. A primeira palavra que disse, em português, foi “mãe” e em inglês “dad” e “thank you”, revela Blessing com a alegria de mãe estampada no rosto.
É no Fundão, em Portugal, que quer criar os seus filhos, a quem quer dar um futuro melhor. Foi esse motivo que a levou a sair do seu país de origem: a Nigéria.
O seu sonho, “a minha oração”, como diz Blessing, é trazer a família para o Fundão, onde encontrou a felicidade: “Eu adoro a cidade e as pessoas à minha volta”.
Blessing sabe que tem de enfrentar outra barreira: “O importante para mim, agora, é aprender português, depois disso já poderei ir às compras, ao cabeleireiro”.
Os amigos enviam-lhe ingredientes para cozinhar a gastronomia típica do seu país, como sopa, e estranha a quantidade de nomes que os portugueses têm para a sopa. Não gosta de peixe, mas adora o nosso bacalhau.
Nas novas funções que assumiu desde que engravidou, lida muito com a alimentação e, mesmo não conseguindo falar, “percebe tudo o que está escrito, o que cada utente come, qual a dieta e distribui esse serviço. Ela está a fazer um trabalho excelente”, acrescenta Cristina Guedes.
Blessing, que até no nome é abençoada, encontrou na Santa Casa da Misericórdia do Fundão um novo recomeço e na cidade um novo lar. Se tiver oportunidade, pretende voltar a frequentar o ensino do português para melhorar os seus conhecimentos da língua que tem sido a sua principal dificuldade. Os seis meses que frequentou o ensino de português, como língua não materna, não foram suficientes para dominar a língua de Camões e obter a liberdade que lhe falta: a liberdade de comunicar.