Portugal é um país pequeno, “mas muito diverso e nada homogéneo”. Foi esta premissa que “guiou” a visita que o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel de Lemos, realizou, nos passados dias 22 e 23 de novembro, a seis Santas Casas do distrito de Beja.

“Durante dois anos não pude visitar as Misericórdias e é fundamental que o presidente da UMP as visite, converse com os provedores e com as Mesas Administrativas e se aperceba das suas dificuldades, porque o país é muito pequenino, mas muito diversos e nada homogéneo”, afirmou Manuel Lemos ao VM.

Ao longo de dois dias, o presidente da UMP passou pelas Misericórdias de Mértola, Almodôvar, Ourique, Aljustrel, Odemira e Ferreira do Alentejo, onde foi recebido pelos respetivos provedores. Seis instituições no mesmo distrito, mas todas elas com especificidades próprias e muitos problemas em comum.

“O ‘denominador comum’ nas queixas [dos provedores] é o aumento dos custos com transportes. Por exemplo, Mértola faz 800 quilómetros por dia em apoio domiciliário. Depois há o aumento do gás e da eletricidade, tudo coisas que nos afligem muito. E ainda a preocupação em como fazer face aos justíssimos aumentos do salário mínimo nacional”, referiu o presidente.

Tudo isto acontece depois de dois anos marcados pela pandemia de Covid-19, que, segundo Manuel de Lemos, tornaram “demasiadamente evidente a necessidade de proteger a sustentabilidade das instituições sociais, pois não há quem as substitua no terreno se elas, porventura, claudicarem”.

“Por isso, temos conversado com o Governo, numa postura aberta, mas firme, no sentido de tentarmos encontrar soluções que são obviamente necessárias para assegurar a sustentabilidade nesta região (e em todo o país), mas sobretudo nesta região, muito desertificada, com muitos idosos e que precisa obviamente de ser protegida”, acrescentou Manuel de Lemos.

Apesar de ter levado muitas notas de preocupação após as reuniões com os provedores das Misericórdias do distrito de Beja, o presidente

da UMP também ficou esperançoso com o futuro. “Toda a gente tem planos para o futuro. E quando se tem planos, isso significa que estão vivos e que estão dispostos a lutar pelas pessoas, pelas suas terras e pelas suas comunidades”, sublinhou com satisfação.

Na sua passagem pelo Alentejo, Manuel de Lemos também afirmou que o aumento dos pedidos de apoio de famílias às Misericórdias em Portugal devido à crise “ainda não é generalizado”, mas já há regiões “onde isso se começa a notar”.

Nesse âmbito, o presidente da UMP defendeu que seja concedido “um apoio extraordinário” às instituições sociais, “que são a grande ‘almofada social’ que está no terreno”, elogiando ainda a intenção do Governo de taxar os lucros excessivos das empresas dos sectores da energia e da distribuição alimentar, receita que será destinada à população mais vulnerável, através das entidades do sector social. “É obviamente uma medida muito boa, que aliás outros países da Europa já tomaram”, afirmou.

No final dos dois dias de visita, o presidente do Secretariado Regional de Beja da UMP, Francisco Ganhão, fez um balanço “muito positivo” da iniciativa que levou Manuel de Lemos ao distrito.

“A deslocação aos concelhos e o contacto direto com as Misericórdias é uma maneira muito mais real de, no terreno, aferir das suas dificuldades”, frisou ao VM.

O presidente do Secretariado Regional disse ainda que todos os provedores aproveitaram a oportunidade para manifestar as suas preocupações relativamente ao “aumento galopante da inflação, que influencia o preço da alimentação, da energia e do gás”.

“É uma equação e um equilíbrio que não é fácil resolver, pois procuramos manter o apoio social aos mais necessitados, ter equipas motivadas e, ao mesmo tempo, fazer face ao aumento dos custos do que faz funcionar os nossos equipamentos”, notou.

A par disso, continuou Francisco Ganhão, os provedores reconheceram que os funcionários das Misericórdias devem ter, na generalidade, melhor remuneração. “Mas para serem mais bem remunerados, é necessário que o Estado, através dos acordos [de cooperação], faça a transferência de valores condignos para que possamos ter uma tabela salarial mais aliciante para os nossos colaboradores”, advogou.

Uma das Misericórdias do distrito de Beja visitadas pelo presidente da UMP foi a de Ourique, onde José Raul Santos, provedor desde 1987, confirmou que entidades como a sua atravessam “um período difícil”, devido aos aumentos da inflação e dos custos com combustíveis e energia.

“Até 30 de setembro tivemos um aumento nos custos com energia de 42%, na ordem dos 13 mil euros e ainda nos falta apurar os meses de outubro, novembro e dezembro. Isto é impensável”, disse.

Um quadro que levou o provedor da Misericórdia de Ourique a pedir “uma resposta muito clara e objetiva” do Governo “para fazer face àquilo que vai ser um descalabro”.

José Raul Santos aplaudiu igualmente a iniciativa de Manuel de Lemos se deslocar à região e contactar com várias Misericórdias.

“Há necessidade efetiva de conhecer a realidade. Uma coisa é aquilo que se transmite nos papéis, mas a realidade é completamente distinta. E há necessidade que venham aos locais e possam levar essa informação. Porque não é tudo igual. A realidade do distrito de Beja é completamente distinta da de Évora, de Setúbal ou do Algarve”, concluiu.

 

Voz das Misericórdias, Carlos Pinto