Acondicionado em 59 caixotes de madeira esteve, durante todo este tempo, um conjunto azulejar que constitui o mais extenso e notável acervo iconográfico sobre a vida e milagres da rainha Santa Isabel que se conhece.
Proveniente da igreja do antigo Convento do Bom Jesus, demolida na década de 40, este acervo é constituído por cerca de 16 mil azulejos setecentistas, da oficina lisboeta de Valentim de Almeida, que revestiam inteiramente a nave da igreja, organizados em painéis figurativos, contendo representações, em alguns casos inéditas.
Com o objetivo de estudar a importância histórica e patrimonial deste conjunto de azulejos, tendo em vista também a sua preservação e valorização, em 2006 foi firmado um protocolo entre a Misericórdia e a Câmara Municipal de Monforte, ao abrigo do qual a transferência dos azulejos foi feita para instalações da autarquia, de modo a que se procedesse aos trabalhos de montagem de painéis, registo e reacondicionamento dos azulejos.
Os trabalhos iniciaram-se em 2012, após os azulejos terem sido transferidos para a Igreja da Madalena, que foi adaptada a oficina de trabalho. Desde então, teve lugar um rigoroso e exaustivo trabalho de inventariação, realizado pela equipa do município, que permitiu a identificação temática da totalidade dos painéis e a reconstituição do revestimento integral da igreja.
Já em 2021, por forma a assegurar o acompanhamento científico dos trabalhos, foi estabelecido um segundo protocolo que envolveu também a Faculdade de Letras de Lisboa (Centros de investigação ARTIS e CLEPUL/GITPP).
Depois de terem sido equacionadas formas de valorização do conjunto, e considerando que o objetivo final deste projeto sempre foi a instalação definitiva deste espólio em espaço público que permitisse a sua fruição, a Câmara Municipal de Monforte optou pela antiga Igreja do Espírito Santo, localizada no centro histórico, requalificada para este propósito, e na qual foi criado o centro temático ‘Monforte Sacro - Painéis de Azulejos do Século XVIII Sobre a Vida e Milagres da Rainha Santa Isabel’, onde agora podem ser contemplados os painéis e outros espaços temáticos.
O VM visitou a Igreja do Espírito Santo para conhecer o resultado de todo o trabalho que deu origem ao ‘Monforte Sacro’ e ficar a conhecer um pouco melhor todo o processo de preservação deste espólio iconográfico dedicado à rainha Santa Isabel.
No decorrer da visita, que fizemos acompanhados pelo provedor José António Rasquinho, foi possível perceber o orgulho que este espaço representa para os monfortenses e, em particular, para a instituição, que, não tendo meios para fazer algo desta dimensão e dignidade, também não tem dúvidas que é um acervo que merece ser “devolvido” à comunidade e que a solução encontrada “dignifica e exalta a valor deste património” e será preponderante para a sua preservação e divulgação.
José António Rasquinho faz ainda questão de destacar o papel que tiveram todos aqueles que, ao longo das últimas décadas, assumiram os destinos da Santa Casa de Monforte na preservação deste conjunto singular da iconografia portuguesa, manifestando o seu desejo que este trabalho seja um importante contributo para atratividade turística do concelho e dinamização da economia local.
O ‘Monforte Sacro’ foi inaugurado no dia 13 de outubro, numa cerimónia que contou com a presença da secretária de Estado da Cultura, Isabel Cordeiro, entre várias outras entidades, num dia que o presidente da Câmara de Monforte descreveu como sendo “histórico” e de “grande felicidade e orgulho”, pois marca o momento em que é devolvido à fruição pública o que diz ser “uma autêntica relíquia e um tesouro nacional”. “Perante a importância histórica e cultural destes painéis de azulejos, era nosso dever colocá-los disponíveis para serem apreciados”, afirmou Gonçalo Lagem.
A secretária de Estado da Cultura referiu, no decorrer da inauguração, a sua convicção da “relevância que ‘Monforte Sacro’ assumirá na redescoberta da vida, da história e da própria iconografia associada à rainha Santa Isabel”, pois “encontramo-nos na presença de um vastíssimo programa azulejar que nos proporciona o privilégio de vislumbrar passagens e milagres, alguns até raramente representados”.
Para a governante, a criação de projetos “tão relevantes quanto este” vai permitir a “redescoberta da identidade cultural de Monforte, pela riqueza do seu património, pelo valor memorável da suas vivências passadas, pela determinação das suas gentes”, sublinhando que este é “um exemplo maior de perseverança, salvaguarda e capacidade de transmissão às gerações do futuro do nosso património cultural e, por isso, deve ser motivo de orgulho para todos os habitantes de Monforte e de todos os visitantes”.
Voz das Misericórdias, Patrícia Leitão