Depois da primeira fase do projeto de Valorização e Inovação em Demências (VIDAS) ter permitido um conhecimento da realidade, o objetivo da segunda fase é, a partir da Unidade de Cuidados Continuados Bento XVI, fazer benchmarking, isto é, “juntar todas as entidades que vão ao Bento à procura da nossa formação e partilhar experiências”, refere o responsável da União das Misericórdias Portuguesas por esta área, Manuel Caldas Almeida.
“Já há experiências de apoio domiciliário, centros de dia, planos para construir ou adaptar edifícios para demências, como é o caso aqui em Castelo Branco, e o que vamos fazer é produzir boas práticas de quem tem prática: boa prática de apoio domiciliário, boa prática de centro de dia, boa prática institucional, de avaliação, estimulação, enfim, profissionalizar esta área e falarmos uns com os outros.”
O também médico e vogal do Secretariado Nacional da UMP falava na conferência promovida pela Misericórdia de Castelo Branco sobre “As doenças neuro degenerativas no século XXI.” Uma realidade pouco conhecida que o projeto VIDAS veio trazer à luz do dia no estudo que realizou a 24 lares e que revelou que quase metade dos idosos tinham algum tipo de demência. “Curioso é que antes deste teste, pedimos às diretoras técnicas que nos identificassem nominalmente as pessoas que elas sabiam que tinham demência, e a percentagem foi de 27%”.
A formação de dirigentes, técnicos e assistentes foi assim “o grande sucesso do projeto VIDAS”, não só porque permitiu aumentar a qualidade de vida das pessoas com demência, como também a sua deteção precoce. Sendo a demência uma doença crónica que se agrava lentamente, “é no lentamente que temos que intervir”. O objetivo é fazer com que as pessoas fiquem muito mais tempo na fase inicial, “onde ainda conhecem as famílias e têm interação social, percebemos que se conseguirmos aumentar a fase I estamos a dar qualidade de vida às pessoas.”
Uma ideia também defendida pelo neurocientista Alexandre Castro Caldas que elogiou o trabalho que as Misericórdias fazem em Portugal. “É um trabalho fantástico, de proximidade, numa área que o governo é incapaz de resolver.”
Sendo Portugal o quarto país da OCDE com mais casos de demência por cada mil habitantes, (19,9 casos por 1000 habitantes) avizinha-se um “tsunami” que vai abalar uma nação sem respostas.
“Eu acho que tem havido um certo atraso de desenvolvimento de políticas de intervenção nestes casos e quanto mais tempo passa, mais difícil se torna porque depois estamos a atamancar soluções.”
Segundo Alexandre Castro Caldas, não são necessários investimentos de milhões, a resposta tem que ser de proximidade. “Para mim é uma solução das autarquias, que devem ser apoiadas nesse sentido, porque há soluções diferentes em cada região do país, elas têm que ser encontradas quase de bairro a bairro, isto é como prever um tsunami que vai acontecer.”
O neurocientista e diretor do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica, defendeu em Castelo Branco, um novo conceito de resposta nas instituições que “não podem ser grandes casas que funcionam como depósitos”, antes, pequenas associações de bairro “com 20 ou 30 pessoas, com duas ou três que saibam do assunto a coordenar um grupo de voluntários que aprendam a fazer, sendo que as pessoas com mais de 60 anos, reformadas, são um exército de voluntários que é preciso aproveitar.”
Castro Caldas defendeu ainda a manutenção dos doentes com demência o máximo tempo possível em suas casas, a criação de centros de dia específicos para poder aliviar os familiares que cuidam deles e o contacto familiar e social porque “é com afetos que estamos a lidar”.
É nessa linha que a Misericórdia de Castelo Branco pretende construir uma unidade de demências, que terá uma capacidade para 30 camas em lar e 30 lugares em centro de dia, com um novo conceito associado, como explica o provedor da instituição, José Augusto Alves.
“Vai ter também um centro de dia para que os cuidadores descansem, vai ter a preocupação de inserir a comunidade familiar e das pessoas que os rodeiam, para contribuir para a valorização da sua qualidade de vida, mas também vai ter uma realidade académica, vai ter um polo de investigação ligado às demências, em parceria com o Instituto Politécnico de Castelo Branco.”
O projeto de arquitetura, elaborado pela mesma equipa que projetou a UCC Bento XVI da UMP em Fátima, já está aprovado e a Misericórdia de Castelo Branco tem agora meio ano para apresentar os projetos de especialidade.
Voz das Misericórdias, Paula Brito