Convenção Nacional de Saúde. Cerca de 1200 pessoas estiveram em Lisboa para apresentar propostas e definir prioridades para a construção de uma Agenda da Saúde para a Década.

A União das Misericórdias Portuguesas esteve reunida com mais de 90 parceiros (ordens profissionais, administrações hospitalares, associações de doentes, etc.) num debate inédito sobre a saúde em Portugal. Cumprindo o repto lançado pelo Presidente da República, há mais de um ano, instituições e membros da sociedade civil apresentaram propostas e definiram prioridades para a construção de uma Agenda da Saúde para a Década e de um Pacto para a Saúde em Portugal.  A Convenção Nacional da Saúde decorreu a 7 e 8 de junho, em Lisboa. 

A um ano da celebração de quatro décadas do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e da aprovação da nova Lei de Bases da Saúde, Marcelo Rebelo de Sousa saudou a iniciativa insistindo num acordo com "o maior denominador comum entre partidos e parceiros". "As metas e os caminhos a definir devem ser, em tese, de longo fôlego e por isso ultrapassando um governo, uma legislatura, um mandato presidencial", defendeu o chefe de Estado no primeiro dia de trabalhos. 

A questão do financiamento do setor esteve no centro deste debate em Lisboa. Oradores e plateia, num total de 1200 pessoas, foram unânimes em relação à necessidade de mais financiamento, orçamentos plurianuais e regulação eficaz do sistema de saúde. 

A criação de uma verba específica para o investimento em equipamentos e infraestruturas, o aumento da fatia do orçamento destinado à prevenção de doenças e a criação de um gabinete interministerial para controlo da fraude são algumas das medidas concretas que a Convenção Nacional de Saúde vai propor ao governo para contrariar o subfinanciamento nesta área. 

Durante o painel dedicado ao financiamento dos sistemas de saúde, o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel de Lemos, afirmou de forma perentória que “não vai haver diminuição dos gastos em saúde porque estamos num país pobre, envelhecido e com aumento de doenças crónicas”. 
Perante este cenário, o desafio é “gastar melhor o dinheiro”. Ou, como sugeriu o responsável da UMP pela área da saúde, Manuel Caldas de Almeida, privilegiar critérios de transparência e clareza para garantir que o “dinheiro dos nossos impostos se traduz em valor para as pessoas”. 

Neste caso, o financiamento pode passar por remunerar a prestação de cuidados de saúde não apenas pelos serviços prestados, mas com base nos resultados alcançados. “Somos todos importantes, público, privado, social, mas podemos fazer mais e com qualidade, precisamos de acertar o modelo de financiamento”, destacou Manuel de Lemos.  

De forma transversal, foram vários os que defenderam, no decorrer dos trabalhos, um modelo de pagamento por resultados, orçamentação transparente e autonomia de gestão das unidades. “Integração dos diferentes setores implica que as decisões de investimento sejam avaliadas ao longo de toda a cadeia de valor e não de forma isolada”, resumiu o presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Enfermeiros, Ricardo Correia de Matos, na apresentação de conclusões das conferências temáticas. 

O objetivo é que Portugal se aproxime, a médio prazo, do investimento médio em saúde per capita na União Europeia, sugeriu a presidente da Comissão da Revisão da Lei de Bases da Saúde, Maria de Belém Roseira, no segundo dia de debate. A par desse reforço financeiro, o documento em consulta pública até 19 de julho prevê um sistema de saúde pautado por regras de transparência, articulação entre os vários setores (público, privado social) e “estabilidade nas políticas que incorporem a evidência científica e cultura da avaliação”.

Para a antiga presidente da assembleia-geral da UMP, “um sistema regulado com garantia de qualidade, separado, mas articulado com um SNS descentralizado e participado, mais inteligente e humano, norteado por valores que passam por trabalho conjunto com os profissionais” pode efetivamente contribuir para melhorar a qualidade de vida das pessoas e ser instrumento corretor de desigualdades sociais e territoriais.

Só este “equilíbrio virtuoso” entre público, privado e social - como lhe chamou o Presidente da República -, poderá concretizar uma ideia repetida pelos diferentes interlocutores ao longo de dois dias de debate: pessoas no centro da prestação de cuidados de saúde. “O alfa e o ómega do sistema de saúde tem nomes e rostos, tem biografias e dramas, são as pessoas, são os portugueses, não apenas os doentes”, lembrou Marcelo Rebelo de Sousa.

Voz das Misericórdias, Ana Cargaleiro de Freitas