Convenção Nacional de Saúde reuniu cerca de 150 organizações para um debate sem agendas corporativas, participado, plural e não partidária

“Foi pelos portugueses que esta Convenção, feita por portugueses, se concretizou. Para fazer parte de um debate que acrescente sucesso a uma história de sucesso. Sem agendas corporativas, participada, plural, não partidária.” A afirmação integra as conclusões da segunda Convenção Nacional de Saúde (CNS), iniciativa que conta com o Alto Patrocínio da Presidência da República.

O evento, que decorreu em Lisboa a 18 de junho, reuniu mais de 150 instituições ligadas à saúde, entre prestadores de serviços dos setores público, privado e social, entidades representativas como as ordens profissionais, associações de doentes, partidos políticos etc.

Para Eurico Castro Alves, que preside a Comissão Organizadora da CNS, esta pluralidade é inédita em Portugal, “um momento único, sem precedentes na Europa”. Apesar de haver visões diferentes e, por vezes, interesses divergentes, os parceiros reuniram-se para encontrar convergências porque o objetivo é comum a todos: melhorar os cuidados de saúde prestados aos portugueses.

Por isso, nas conclusões, apresentadas pela bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, Ana Paula Martins, as 150 organizações reafirmaram que “os portugueses não podem ter listas de espera de anos por uma primeira consulta da especialidade ou cirurgias, não podem ter as enormes falhas de medicamentos que têm atualmente na nossa rede de farmácias, não podem esperar eternidades por tratamentos inovadores que podem fazer a diferença, não podem continuar a não ter cuidados continuados e paliativos para si e para os seus quando necessitam, que não só gera sofrimento e desesperança, mas sobrecarrega desnecessariamente as famílias e os cuidadores, exaustos e perdidos num sistema que não é amigo do cidadão”.

Para inverter este cenário onde o Serviço Nacional de Saúde “dá sinais de cansaço”, conforme se lê nas conclusões, “todos colaboram”, disse Eurico Castro Alves em declarações ao VM, deixando ainda um repto aos partidos políticos que brevemente vão ser escrutinados pelos portugueses através das urnas. “Espero que se inspirem no que foi dito naquela sala, podem não levar tudo em consideração, mas algo vai acontecer porque as conclusões apresentadas emanaram diretamente da sociedade civil”.

A segunda edição da CNS decorreu numa altura em que é discutida a nova lei de bases da saúde e por isso as 150 organizações ali presentes deixaram aos partidos políticos um aviso: “o sistema de saúde é complexo e não pode ser objeto de intervenções pouco pensadas, sujeitas a imediatismos eleitorais ou interesses conjunturais. Na saúde não chega fazer muito…tem que se fazer bem. E defender o interesse público, que não tem cor política nem é propriedade de uns ou outros. O bem comum faz parte da defesa intransigente de princípios fundacionais da democracia e realiza-se na atitude de cada um de nós.”

Numa altura em que um SNS essencialmente público marca a agenda política, Eurico Castro Alves disse ao VM que, apesar de acreditar que o setor público é imprescindível, sabe que para muitos portugueses o acesso a cuidados de saúde é assegurado pelas entidades do setor social, entre elas as Misericórdias. O público, continuou, não chega a todos, e neste sentido a oferta do setor social, em complementaridade, tem sido determinante para garantir saúde com excelência e segurança aos portugueses.

Também o bastonário dos Médicos, que discursou na sessão de encerramento, fez referência a este debate. Para Miguel Guimarães, “combater as desigualdades não é discutir as parcerias público-privadas, é discutir efetivamente o reforço do nosso bem maior que é o SNS. Cidadãos mais saudáveis são mais produtivos.”

Manuel de Lemos, presidente da União das Misericórdias Portuguesas, que foi orador na sessão plenária que debateu “O Sistema de Saúde para o Cidadão”, partilha da mesma opinião.

“A questão da organização do sistema é sempre instrumental e por isso reduzi-la a uma única opção (pública, social ou privada) será sempre redutora, porque para além do mais coarta a possibilidade de cuidar e, sobretudo, de cuidar bem, a tempo e horas e com qualidade, dos cidadãos.”

Para Manuel de Lemos, o acesso a serviços de saúde não pode estar dependente dos rendimentos de cada um, mas isso não reduz o SNS ao setor público. Cada vez mais, o SNS deve privilegiar o diálogo, a cooperação, a complementaridade e a parceria entre o Estado, os prestadores e os doentes representados pelas suas associações para que o cidadão seja o centro do sistema. “Cuidar dos enfermos, como manda uma das obras de misericórdia, é justamente colocar o cidadão no centro do sistema”, concluiu.

Mais de mil pessoas marcaram presença na segunda edição da CNS, que decorreu no mesmo dia em que o Parlamento debatia o ponto relativo às parcerias público-privadas na lei de bases da saúde. Voz das Misericórdias, Bethania Pagin