Projeto da Misericórdia de Fátima-Ourém apoia pessoas com demência e grandes dependentes para melhorar a qualidade de vida

É no quintal de que ainda cuida, debaixo do limoeiro, que Rosário Laíns, de 82 anos, recebe as técnicas do EMMILEA, o novo projeto da Misericórdia de Fátima-Ourém que leva apoio terapêutico, psicológico e social a casa de dezenas de utentes, com o objetivo de adiar a institucionalização de pessoas acamadas e/ou com demência.

É neste último grupo que se integra Rosário Laíns, diagnosticada há seis meses com Alzheimer "moderado". Entrou no projeto por iniciativa de uma das cuidadoras, a filha Zulmira Reis, que teve conhecimento do EMMILEA através da internet. Propôs aos irmãos, que "prontamente" concordaram, e à mãe, que, num primeiro momento, se mostrou "muito reticente". "Agora, adora. Estranhou quando nas férias uma das técnicas não veio", conta a cuidadora, já na sala de estar onde decorrem as sessões de musicoterapia. Sentada no sofá, rodeada de fotos dos 12 filhos e dos muitos netos e bisnetos, Rosário Laíns vai acompanhando com a voz os acordes que Inês Ferreira retira da guitarra, sempre com a preocupação de ir às memórias da utente e às cantigas que costumava cantar enquanto trabalhava no campo. "Cantava muito. Agora, já me esqueci de muita coisa", reconhece a idosa, que se esforça para ir ao seu baú das recordações. "Este contacto com outras pessoas, que a estimula de uma maneira que nós não conseguimos, faz-lhe muito bem", refere Zulmira Reis, salientando também o trabalho de terapia ocupacional que as técnicas desenvolvem com a mãe.

Apoiado pelo Portugal Inovação Social, o EMMILEA - Equipa Móvel Multidisciplinar de Intervenção Local Especializada e Autoajuda - conta com cinco técnicas. Sob coordenação de Diana Silva, a equipa é constituída por Carolina Reis, técnica de serviço social, pela musicoterapeuta Inês Ferreira, por Precisa Santos, psicóloga, por Jéssica Reis, fisioterapeuta, e por Joana Jorge, terapeuta ocupacional.

Carolina Reis explica que, depois de uma primeira avaliação, a equipa reúne para aferir as necessidades de cada utente e elaborar um plano de desenvolvimento individual. "Cada pessoa pode beneficiar de uma ou mais terapias, por vezes em simultâneo", refere a técnica.

No caso de José Ribeiro, de 73 anos, diagnosticado com Alzheimer, o trabalho incide no treino cognitivo. Com apoio de uma plataforma digital, as sessões com a terapeuta ocupacional vão estimulando o cálculo mental, a memória, a linguagem e a atenção. A cada nível superado, um ligeiro sorriso de José, que, segundo a esposa, antes de iniciar o programa, "passava os dias na cama". "O projeto é ótimo. Encontraram forma de o motivar a ser um pouco mais ativo. Até já faz pequenas caminhadas", revela a mulher, Maria Ribeiro.

No caso de Jacinta Neves, acamada desde maio de 2021, a abordagem é outra, completamente diferente. "Não fala, não interage nem se mexe, mas reage à música. Dá a sensação que fica mais relaxada e tranquila", conta Lúcia Rodrigues, a filha, que vai mimando a mãe, ao som das músicas cantadas e tocadas por Inês. Noutros dias, a presença das técnicas é aproveitada pela cuidadora e pelo pai, que a ajuda na tarefa, para descansar um pouco. 

"É uma resposta que faltava. Há poucas soluções para quem se encontra acamado e permanece em casa", constata o filho de Maria José Conceição, uma das 44 pessoas beneficiárias do projeto, que tem ainda capacidade para acolher mais 16 pessoas. No caso de Maria José, acamada há seis anos, além da musicoterapia, beneficia de fisioterapeuta. "Gosto muito das massagens da Jéssica. São é poucas", diz, entre risos, numa pausa nas "cantorias".

Carolina Reis frisa que a equipa intervém "numa abordagem terapêutica não farmacológica". O objetivo é proporcionar acesso a recursos que "melhorem a qualidade de vida dos utentes nos seus domicílios, atenuar o isolamento social e reforçar o bem-estar físico psicológico e emocional" de utentes e cuidadores.

A par das sessões de estimulação física e cognitiva, o projeto contempla a distribuição de equipamentos de teleassistência. Também já está a funcionar um grupo de autoajuda para cuidadores. Todos os serviços são gratuitos.

Voz das Misericórdias,  Maria Anabela Silva