O Auditório da Epralima, em Ponte da Barca, encheu-se para receber nos dias 29 e 30 de março, a segunda edição do ‘Encontro-Demências: Sinergias em Ação’, organizado pela Santa Casa da Misericórdia de Ponte da Barca, em parceria com a Universidade do Minho. Da reflexão saiu a certeza de que é imperioso garantir a sustentabilidade das instituições que cuidam dos nossos idosos.
Portugal é um país com taxas preocupantes de população idosa com demência. Por isso, segundo o provedor da Misericórdia de Ponte da Barca, é necessário agir. O aumento da taxa de incidência de doenças crónicas e demências nos idosos mudou, irremediavelmente, o perfil das respostas sociais. “Os nossos lares se assemelham, cada vez mais, a unidades de cuidados continuados, sendo de igual modo inquestionável que, dia após dia, a fronteira entre a saúde e a segurança social é cada vez mais ténue”, afirmou Rui Folha.
“As Misericórdias e os demais parceiros do setor solidário enfrentam hoje um grande desafio que é conseguir garantir a sustentabilidade das instituições e dar uma resposta capaz e competente a uma população cada vez mais envelhecida num quadro em que o acompanhamento familiar é também cada vez mais complexo”, disse Rui Folha.
“A sustentabilidade das instituições passa, sobretudo, pelo seu equilíbrio financeiro” e, por isso, o provedor considera “necessário e urgente” um processo de recuperação das comparticipações para valores aceitáveis e suportáveis pelos familiares e comunidade. Contudo, continuou Rui Folha, esta atualização de valores tem de se basear nalguns pressupostos como a qualidade dos serviços prestados, salários mais justos e equitativos, equipamentos mais fortes e investimento na área da inovação.
“Tendo presente toda esta realidade não me parece possível manter um olhar tradicional sobre os sistemas de saúde”, culminou o provedor. É necessário que a convergência entre a saúde e a segurança social exista para que seja possível preparar Portugal para o envelhecimento contínuo da população. Se algumas reformas não forem postas em prática, quem ficará lesado será, em primeira instância, os idosos, seguidamente das instituições de solidariedade social que deles cuidam.
Para António Leuschner, coordenador do Plano Nacional de Saúde para as Demências e médico psiquiatra, o problema da sustentabilidade vai muito além das questões financeiras, que também considera importantes. “Há muitos anos digo que ou nos entendemos ou não vamos a lado nenhum. E quando digo nos entendemos, refiro-me a nós os cidadãos portugueses, em geral, aos cidadãos que trabalham na área da saúde. Ou conseguimos encontrar sinergias que nos permitam aproveitar os recursos que são, de facto, escassos ou estamos a cavar a não sustentabilidade”, afirmou.
Para Leuschner, “temos muito a fazer para realmente dar a todas as pessoas com demência condições para viverem os últimos dias da sua vida com dignidade e confiança”. Por isso, o responsável considera urgente uma aproximação grande entre a área da saúde familiar e mental. “Não tenhamos dúvidas que aquilo que nós temos que montar é uma resposta na área da saúde que depois tenha interfaces com a segurança social, setor solidário e privado, no sentido de ir ao encontro destas necessidades que vão sendo cada vez mais identificáveis”.
O papel das Misericórdias
As Misericórdias do país têm tido um papel importante, e exemplar, na ajuda, apoio e concretização de projetos sustentáveis na área das demências, como Manuel Caldas de Almeida, do Secretariado Nacional da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), afirma. “Para conseguir planear é preciso saber o que temos. Por isso fizemos um estudo de avaliação daquilo que se passa nos lares e no apoio domiciliário em Portugal e a conclusão é que os nossos lares e o apoio domiciliário não têm nada a ver com aquilo para o qual foram feitos”.
“Os nossos lares foram feitos para pessoas relativamente autónomas, que queriam evitar o isolamento social e a realidade é que quem está nos lares são pessoas com grande perda funcional, cognitiva. Cerca de 50% dessas pessoas têm demência”.
Depois da realização deste estudo, a UMP concluiu que “os lares estão cheios de pessoas com demência e por isso era necessário fazer aquilo que fizemos, ou seja, criar uma unidade piloto onde pudéssemos testar métodos de trabalho e onde os profissionais das Misericórdias pudessem receber formação”. Uma vez que a realidade das demências nas pessoas idosas é cada vez mais palpável, Caldas de Almeida assevera: “é necessário formação, formação e formação”.
Os lares, continuou o responsável, devem ser cada vez mais espaços dotados com as especificações técnicas e humanas para dar respostas eficazes. Estes planos e todo este enquadramento “custam dinheiro às Misericórdias, mas de alguma maneira este governo vai ter de perceber que pessoas com demência em apoio domiciliário, em casa ou nos lares, custam mais do que pessoas sem demência. Por isso é importante que se preveja um enquadramento legal diferente”, concluiu.
Voz das Misericódias, Vanessa Reitor