"Não pode ser apenas quando há uma degradação pontual e uma degradação acentuada da situação financeira que o Estado se lembra que é preciso acorrer às Misericórdias. Ou quer assumir a responsabilidade por prestações sociais e cobertura social ou não quer. Não pode querer intermitentemente, quando a situação é muito aflitiva", referiu diante de centenas de provedores e outros responsáveis políticos num momento de “transição” marcado por desafios de convergência com o Estado e renovação das instituições.
Reforçando os alertas deixados por Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a necessidade de compromisso efetivo com as Misericórdias, o presidente da UMP considerou que “o que está em causa é a sustentabilidade das próprias políticas públicas sociais em Portugal”. E a responsabilidade de assegurar essa sustentabilidade cabe ao Estado que, segundo Manuel de Lemos, “pensa e desenha as respostas sociais, legisla as respostas, regulamenta as respostas e fixa o tempo para as implementar pela via das Misericórdias e outros parceiros do setor”.
Para que esta mudança de paradigma seja efetiva, considera, “pois, imperioso que o Estado acompanhe e coopere com os trabalhos em curso do setor sobre os custos reais das respostas sociais [Ver Circular 31/2023 sobre grupo de trabalho para apuramento dos custos]”.
Elencando as principais áreas de cooperação com o Estado – envelhecimento, saúde, educação e habitação -, o presidente da UMP destacou em primeiro lugar a preocupação com a necessidade de “transformar radicalmente o serviço de apoio domiciliário”, para diminuir a pressão sobre os lares. A este respeito, criticou a alocação de verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que deixou de fora as “candidaturas das Misericórdias do interior para a remodelação dos lares”.
Na área da saúde, priorizou o reforço da articulação com a Segurança Social “para que, rapidamente, possamos transformar os projetos que comungamos em realidades com efeito no povo”, dando como exemplos os balcões SNS 24 nas estruturas residenciais, as consultas e cirurgias nos hospitais e a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados.
Para o ministro da Saúde, também presente na sessão de abertura do congresso, esta foi uma das principais lições a retirar da pandemia: “a necessidade de aprofundar a ligação entre o setor social e o setor da saúde”. Perante os desafios ligados a uma população envelhecida, Manuel Pizarro considera inevitável reaproximar as duas áreas, “reforçar a rede de cuidados continuados, reformular algumas respostas e, naturalmente, repensar o financiamento para conseguirmos um equilíbrio virtuoso entre o cumprimento das funções sociais do Estado português, enquanto garante da dignidade e, ao mesmo tempo, equilibrar as contas públicas”.
Em todas as intervenções, a mensagem foi de compromisso conjunto e de gratidão aos trabalhadores e dirigentes de todo o país pela “coragem, devoção e sacrifício ilimitado”, como referiu Marcelo Rebelo de Sousa, que, nas palavras de Manuel Pizarro, “fizeram do combate à pandemia a causa das suas vidas”.
Num agradecimento e homenagem pública aos que cuidaram, o presidente da Mesa da Assembleia Geral da UMP reconheceu que “durante esse tempo, as Santas Casas travaram uma luta tenaz e difícil contra o vírus e apesar de muitas dificuldades, angústias e incompreensões revelaram uma capacidade de resistência e superação notáveis”.
Refletindo sobre a agenda deste congresso, José da Silva Peneda referiu ainda que a realidade de problemas como a sustentabilidade, qualificação e relação com o Estado “é hoje mais complexa e exige muito mais em capacitações, em inovação, na mobilização de meios técnicos e financeiros, na gestão eficiente de recursos e no aproveitamento da sociedade digital”.
Na “voragem do tempo que vivemos”, Manuel de Lemos defendeu, no final da sessão, que o futuro das Misericórdias e do setor passa também pela sua representação na Comissão Permanente de Concertação Social, através da Confederação Portuguesa da Economia Social, deixando claro que este “setor é fundamental para o desenvolvimento económico, para o emprego sustentado e, naturalmente, para a gestão e sustentabilidade das políticas públicas”.
Voz das Misericórdias, Ana Cargaleiro de Freitas