Manuel Caldas de Almeida, vice-presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP) escreveu um artigo de opinião na edição de outubro do jornal “Voz das Misericórdias” sobre os tempos que vivemos e como devemos preparar o futuro na resposta aos mais idosos.

Manuel Caldas de Almeida
Vice-presidente da União das Misericórdias Portuguesas

Esta será talvez uma das mais graves crises que as Misericórdias de Portugal atravessaram, tendo que continuar a cumprir a nossa missão em plena pandemia mundial, com necessidades acrescidas dos mais frágeis da sociedade e com quem ponha em causa a nossa ética, missão e importância na sociedade. Além disso, os crescentes custos impostos pelas medidas sanitárias vieram juntar-se a situações anteriores de difícil sustentabilidade institucional.

A afirmação do setor social e das Misericórdias como suporte dos mais frágeis e motor de desenvolvimento, emprego, viabilidade e equidade territorial pode ser posto em causa por alguns, mas é afirmada diariamente quer a nível local, quer pela afirmação de consistência, profissionalismo, ética e espírito de missão. Os resultados aos vários níveis durante estes terríveis últimos meses falam por nós.

Olhar para o futuro próximo e distante exige resiliência e manutenção da capacidade de exercer as nossas obras para além da simples sobrevivência financeira, num esforço individual, mas sempre bem articulado, quer a nível regional quer nacional.

Também as entidades oficiais, governos, sociedade civil e cidadãos portugueses saberão que este valioso património que são as Misericórdias merece e necessita da participação e do suporte que manteve a sua importância nacional, aliada à capacidade de resposta local, e que a sua missão e desempenho merecem.

Exige-se uma comparticipação rigorosa, mas realista nas várias valências e atividades, considerando com honestidade os acréscimos de custos multifatoriais dos últimos três anos e principalmente desde março de 2020.

Simultaneamente a esta evidência da problemática da sustentabilidade, a pandemia veio tornar claro que as respostas às pessoas mais velhas estão afastadas da realidade no que respeita à legislação e enquadramento.

É evidente para quem trabalha nesta área que as pessoas mais velhas querem hoje (felizmente) manter a qualidade de vida de que usufruíram ao longo do seu percurso e esta exigência ultrapassa agora largamente o suporte hoteleiro e de atividades básicas de vida.

A entrada na terceira idade da geração que na adolescência e enquanto adultos jovens tanto questionaram o “status quo” é obviamente momento de novas necessidades expressas. Aliado a isto temos o fator longevidade com crescente número de pessoas com muitos anos e com dependências físicas e funcionais, fragilidades geriátricas e demências.

A pandemia veio assim evidenciar a necessidade urgente de rever toda a definição e prática de lar, centro de dia e apoio domiciliário.

A UMP iniciou este processo pelo serviço de apoio domiciliário (SAD), obviamente cada vez mais o pilar de suporte aos mais idosos. Depois de uma apresentação oficial pública, obrigatoriamente com as restrições do momento que vivemos, seguiram-se dois webinares com ampla participação e esperamos agora comentários e participação ativa para que este seja um projeto das Misericórdias e não apenas da UMP.

Temos agora em preparação o projeto Lar do Futuro e Centro de Dia.

Pretende-se, mais do que a necessária adaptação as realidades atuais e futuras, desenvolver uma proposta de trabalho centrada nas necessidades individuais em cada fase da vida e do envelhecimento, numa lógica de continuidade e não de resposta fixa e permanente com um plano partilhado e sequencial.

As crises devem ultrapassar-se com crescimento e evolução individual e institucional. Soluções de sustentabilidade e de adaptação são um trabalho conjunto e têm de ser sentidos por cada Misericórdia como suas.

Voz das Misericórdias, edição de outubro de 2020